PARTE [1] O funcionamento do sistema nervoso centralCAPÍTULO [1]Ver sumário |
O sistema nervoso é um sistema complexo que define uma série de aspectos relacionados à interação dos indivíduos com o mundo. Ele pode ser dividido de diversas formas, que variam de acordo com vários critérios de classificação, sendo os principais:
- Critérios anatômicos. Sistema nervoso central (SNC – encéfalo e medula espinal) e sistema nervoso periférico (nervos, gânglios e terminações nervosas).
- Critérios embriológicos. Prosencéfalo (telencéfalo e diencéfalo – cérebro), mesencéfalo e rombencéfalo (metencéfalo – cerebelo e ponte – e mielencéfalo – bulbo).
- Segmentação ou metameria. Sistema nervoso somático (aferente e eferente) e sistema nervoso visceral (sistema nervoso autônomo: simpático e parassimpático).
- Comportamental. O cérebro humano pode ser dividido em quatro componentes principais: córtex sensitivo primário, córtex motor primário, córtex associativo e sistema límbico.
Mais adiante, serão descritos todos os componentes que constituem o SNC e suas respectivas funções, utilizando os critérios anatômicos.
Neurodesenvolvimento típico e atípico
Nos últimos 30 anos, a hipótese de que os transtornos psiquiátricos são consequência de alterações durante o neurodesenvolvimento recebe cada vez mais atenção, e novas evidências corroboram essa teoria. As descobertas de alterações cerebrais, motoras e cognitivas em fases iniciais das doenças e até mesmo antes de manifestações sintomáticas contribuem para fortalecer tal hipótese.
Os estudos transversais em saúde mental demonstraram que mais da metade dos pacientes indica o início dos sintomas na infância, e quase dois terços, antes da adolescência. Portanto, é fundamental entender a trajetória típica do neurodesenvolvimento para estudar as possíveis implicações dos desvios do neurodesenvolvimento na fisiopatologia dos transtornos mentais.
O neurodesenvolvimento típico é um processo complexo, dinâmico e envolve interações gene-ambiente, que resultam em mudanças a curto e longo prazos na expressão gênica, nas interações celulares, na formação de circuitos cerebrais, nas estruturas neurais e no comportamento ao longo do tempo. Alguns desses processos iniciam-se e terminam durante o período gestacional, enquanto outros se estendem para o período pós-natal. O SNC começa a se desenvolver a partir da formação do tubo neural, que ocorre na segunda semana gestacional. A formação do tubo neural é definida pela carga genética e modulada por fatores ambientais. Entre a quarta e a quinta semanas gestacionais, o tubo neural, que é originado do folheto embrionário mais externo (ectoderme), fecha-se completamente, dando início ao processo de diferenciação e proliferação celulares. Aproximadamente na 12ª semana de gestação, o número de neurônios atinge seu pico máximo. Nesse período, o processo de migração neuronal tem início, em que, orientadas pelas células da glia por meio de um processo mediado por diversas moléculas de adesão, as células neuronais migram para formar as diferentes camadas corticais. As células neuronais que nascem na zona ventricular migram radialmente, usando as células da glia como ancoragem, dando origem às células piramidais. As células geradas na porção embrionária mais ventral migram tangencialmente e originam os interneurônios corticais. A sinaptogênese tem início aproximadamente na 22ª semana gestacional. Uma vez no córtex cerebral, cada neurônio precisa “encontrar” a posição adequada e estabelecer conexões sinápticas funcionantes, caso contrário será eliminado mediante processo de apoptose. Falhas em qualquer um desses elementos podem potencialmente causar uma alteração no desenvolvimento, resultando em lesões mais ou menos focais, dependendo da extensão e do tipo de defeito envolvido. Já o processo de mielinização tem início no final da gestação e persiste até a vida adulta.
É importante salientar que tanto o processo de maturação cortical quanto o de mielinização seguem uma trajetória muito específica e de forma organizada. O processo de maturação cortical inicia-se nas regiões cerebrais dorsais no sentido posteroanterior (parietal-frontal) e inferossuperior. A literatura demonstra que a maioria das regiões do cérebro apresenta declínio linear monotônico da espessura cortical, ou seja, uma trajetória de maturação cortical linear. Existem poucas áreas de trajetórias cúbicas, em que a espessura cortical dessas regiões aumenta durante a infância, atinge um pico no final da infância, diminui na adolescência e se estabiliza durante a fase adulta. As regiões cerebrais que apresentam trajetória cúbica se restringem principalmente às áreas temporoparietais bilaterais e ao córtex pré-frontal direito, em que os picos de espessura cortical se encontram próximo aos 8 anos. Entretanto, existem outras medidas complementares de desenvolvimento cortical, por exemplo, a girificação cortical que representa a característica de dobramento do córtex cerebral, em que há aumento da área da superfície cortical e, portanto, o número de neurônios em um volume limitado do crânio. Uma medida de girificação cortical, que pode ser chamada de índice de girificação, corresponde à relação entre a área superficial interna cortical total e a área de uma superfície externa que envolve suavemente o córtex e fornece informações complementares sobre o processo de maturação cortical. Sabe-se que o índice de girificação aumenta de acordo com o volume cerebral entre as espécies e reduz durante o envelhecimento saudável em humanos. Estudos que utilizam dados de imagem de ressonância magnética (IRM) e post-mortem demonstram que o índice de girificação segue uma trajetória logarítmica em função da idade. A girificação aumenta após o nascimento, o que foi confirmado por um recente estudo longitudinal de imagem em crianças antes dos 2 anos. No entanto, ainda não está bem-estabelecido em qual momento, ao longo do desenvolvimento, o índice de girificação atinge seu pico, embora um estudo recente indique que esse índice comece a diminuir a partir dos 4 anos de idade. Esse mesmo estudo sugere trajetórias atípicas de girificação em pacientes com transtornos psiquiátricos maiores (esquizofrenia e transtorno bipolar). O índice de girificação em pacientes com transtorno bipolar e esquizofrenia diminui mais rapidamente do que em indivíduos saudáveis.
Pacientes com esquizofrenia apresentaram diminuição significativa do índice de girificação no córtex pré-frontal dorsolateral, no córtex cingulado anterior e no córtex supramarginal, regiões que estão associadas a funções executivas, memória de trabalho, manejo de conflitos, modulação da motivação e regulação do humor.
A redução do índice de girificação em pacientes com transtorno bipolar foi menos extensa em comparação aos pacientes com esquizofrenia. Entretanto, as principais diferenças de índice de girificação em pacientes com transtorno bipolar em comparação aos indivíduos saudáveis localizam-se nas regiões frontais inferiores e foram consistentes com estudos prévios envolvendo volume da substância cinzenta cortical. Observou-se também que a trajetória de girificação cortical de pacientes com depressão maior pode ser diferente de controles saudáveis, assim como de transtorno bipolar e esquizofrenia, mas nenhuma região cerebral mostrou alteração significativa em pacientes com transtorno depressivo maior (TDM).
O modelo neurobiológico da maioria dos transtornos mentais sugere a implicação de vários genes na etiologia, cada um deles com pequeno efeito. A suscetibilidade genética de cada indivíduo para um transtorno é muito variável, e a expressão de determinados genes depende de fatores ambientais. Outro aspecto relevante é que o mesmo fator genético pode levar a diferentes transtornos psiquiátricos. Assim, a combinação de aspectos ambientais e genéticos permitiria a identificação de fatores preditores mais robustos.
Um exemplo de transtorno do neurodesenvolvimento é a esquizofrenia. A esquizofrenia é uma doença de alta prevalência, que afeta 1% da população ao longo da vida, principalmente indivíduos na transição da adolescência para a vida adulta. A etiologia da doença envolve uma série de fatores biológicos (genéticos e do neurodesenvolvimento) e ambientais (infecção viral, insultos fetais, abuso de substâncias) que predispõem o indivíduo ao transtorno. Um dos mecanismos propostos é que a predisposição genética para o desenvolvimento da esquizofrenia determinaria maior predisposição a fatores ambientais precoces (complicações obstétricas, como infecção viral, insultos fetais), que causariam alterações neurofisiológicas e estruturais (alteração da arborização neuronal, dopaminérgica, entre outras). Essas alterações centrais tornariam os indivíduos mais vulneráveis aos fatores ambientais tardios (p. ex., consumo de substâncias) que influenciam a ocorrência do primeiro episódio psicótico. Nesse mecanismo proposto, o indivíduo apresentaria neurodesenvolvimento normal de início, entretanto seria submetido a um insulto no período mais crítico do desenvolvimento (p. ex., trauma perinatal, infecção viral congênita, restrição proteica, dieta pobre), que alteraria a citoarquitetura cerebral e promoveria maior vulnerabilidade à doença. Outro mecanismo seria o indivíduo já apresentar desenvolvimento alterado desde o início, não aparente nos primeiros anos, mas evidenciado durante a maturação por algum fator estressor. Essa segunda hipótese explica o fato de que, entre os indivíduos submetidos às mesmas condições patogênicas, apenas aqueles com vulnerabilidade maior evoluem para esquizofrenia.
Componentes do sistema nervoso central
Lobos frontais
Os lobos frontais estão envolvidos nas funções executivas (tomada de decisões, planejamento, solução de problemas e raciocínio), no controle motor voluntário, na cognição, na inteligência, na atenção, no processamento e na expressão da linguagem, na motivação, etc. Apresentam como subestruturas o córtex pré-frontal (dorsolateral, ventromedial, orbitofrontal e medial), envolvido nas chamadas funções superiores, os córtices pré-motor e motor primário, e a área de Broca, responsável pela expressão da linguagem.
Lesões nos lobos frontais, de acordo com suas sub-regiões, podem levar a paralisias motoras (córtices pré-motor e motor primário), comportamento desinibido, irritabilidade e comportamento explosivo, conduta social inadequada e dificuldades na tomada de decisões, dificuldades nas interações sociais, alterações do humor, déficit na expressão da linguagem e alterações da personalidade. Na esquizofrenia, no transtorno bipolar e no transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH), são observadas disfunções localizadas dos lobos frontais.
Estudos recentes baseados em várias evidências na área de neurociências (neuroanatomia estrutural, neuroanatomia funcional, estimulação cerebral) demonstram envolvimento importante do córtex pré-frontal na manifestação de sintomas comportamentais, presentes em grande parte dos transtornos psiquiátricos. Os achados, no entanto, evidenciam participações diferentes das duas principais sub-regiões do córtex pré-frontal (ventromedial e dorsolateral), principalmente em consequência de padrões de conectividade distintos.
O córtex pré-frontal ventromedial é composto pela porção ventral do córtex pré-frontal medial e pela parte medial da região orbital. Apresenta projeções para o hipotálamo e a substância cinzenta periarquedutal (controle autonômico dos processos ligados às emoções), para a região ventral do estriado (envolvido no circuito da recompensa) e para a amígdala (envolvida em processos emocionais ligados ao medo). Já o córtex pré-frontal dorsolateral inclui a região média e superior dos giros frontais e a parte lateral dos lobos frontais, apresentando conexões com o córtex sensitivo, as áreas pré-motoras e as áreas laterais do córtex parietal. Em virtude dos padrões de conectividade distintos, tais regiões têm sido associadas a funções diferentes. Enquanto o córtex pré-frontal dorsolateral está relacionado às funções “executivas”, associadas ao aprendizado, à memória e à execução de atividades, o córtex pré-frontal ventromedial está implicado nas funções “emocionais” ou “afetivas”, ou seja, na produção e no controle das emoções. As evidências demonstram, no entanto, que, em alguns transtornos mentais, como na depressão e na esquizofrenia, há presença de sintomas tanto da esfera cognitiva como da comportamental, sugerindo um padrão de interação entre essas duas regiões.
Lobos temporais
Os lobos temporais estão relacionados a memória, audição, processamento e percepção de informações sonoras, reconhecimento de faces e objetos, capacidade de entender a linguagem, processamento visual de ordem superior e regulação das reações emocionais. Têm como subestruturas a amígdala, o córtex auditivo primário, a área de Wernicke e os giros temporais.
A lesão dos lobos temporais pode resultar em agnosias, prejuízo da memória e da compreensão da linguagem. Na demência de Alzheimer, há, principalmente, a atrofia do lobo temporal medial que se inicia no córtex entorrinal, no hipocampo e na amígdala. Na esquizofrenia, foi descrita disfunção do lobo temporal, mesmo em familiares saudáveis.
Lobos parietais
Os lobos parietais estão envolvidos na percepção e na integração da informação somatossensorial (tato, pressão, temperatura e dor), no processamento visuoespacial, na atenção, na orientação espacial e na representação numérica. Apresentam como subestruturas o córtex somestésico, o lobo parietal superior e inferior e o pré-cuneos.
A lesão dos lobos parietais pode levar a perda da habilidade em localizar e reconhecer objetos e partes do corpo (heminegligência), dificuldade em discriminar a informação sensorial, desorientação e falta de coordenação.
Lobos occipitais
São os únicos lobos aos quais podem ser atribuídas funções específicas (visão da cor, do movimento, da profundidade, da distância). Apresentam como principais estruturas as áreas visuais (primária e secundária). A lesão nos lobos occipitais pode levar a cegueira, alucinações, inabilidade em ver cores e sinestesia.
Lobo da ínsula
O lobo da ínsula fica coberto por partes dos lobos temporal, frontal e parietal e só é visualizado quando os lábios do sulco lateral são afastados. Apresenta importante função na percepção gustativa (paladar). Constitui-se em parte do sistema límbico e está envolvido na coordenação das emoções. Alterações na ínsula podem levar à perda do paladar. Estudos recentes de neuroimagem estrutural e funcional com pacientes com transtornos psiquiátricos observaram alterações na ínsula, confirmando, assim, seu envolvimento nos processos emocionais.
Sistema límbico
É constituído por um grupo de estruturas envolvidas no processamento e na regulação das emoções, da memória e do interesse sexual. Foi inicialmente descrito por James Papez em 1937. O então denominado “circuito de Papez” era composto por hipocampo, fórnix, corpos mamilares, núcleo anterior do tálamo e giro do cíngulo. Posteriormente, a amígdala, a área frontobasal anterior e o córtex orbitofrontal foram acrescidos às estruturas previamente descritas. Constitui-se em importante sítio de ação dos psicofármacos, uma vez que tem sinapses de vários circuitos neuronais envolvidos nos transtornos psiquiátricos (noradrenérgicos, serotonérgicos e dopaminérgicos, entre outros). Alterações no sistema límbico têm sido evidenciadas na maioria dos estudos de neuroimagem estrutural e funcional em pacientes com transtornos psiquiátricos. As principais estruturas que compõem o sistema límbico são:
- Amígdala. Está envolvida no processamento do medo e das emoções, do aprendizado, da recompensa e na resposta de fuga ou luta. Uma lesão na amígdala pode resultar em agressividade, irritabilidade, perda do controle emocional, déficit na memória de curto prazo e dificuldade em reconhecer emoções. Sua disfunção já foi observada em diversos transtornos, como, por exemplo, depressão, transtorno bipolar, transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), demências, autismo e transtorno da personalidade borderline.
- Hipocampo. É essencialmente uma faixa curva de córtex primitivo (arquicórtex) localizada na porção medial do lobo temporal. Medial e inferiormente, o hipocampo é contíguo ao subículo, ao pré-subículo e ao parassubículo, repousando sobre o córtex entorrinal e o giro para-hipocampal. O termo “hipocampo” é utilizado em geral para descrever conjuntamente duas regiões interligadas: o giro denteado e o hipocampo propriamente dito (CA; “corno de Amon”). Ambos têm organização interna trilaminada, composta por dois tipos de células principais: as células granulares do giro denteado e as células piramidais do CA, as quais são divididas nos setores CA1, CA2 e CA3. Cada uma dessas regiões mantém um padrão organizado de conexões intrínsecas e extrínsecas, e a principal aferência para o hipocampo origina-se no córtex entorrinal. O hipocampo apresenta como funções principais o armazenamento da memória recente, a formação da memória de longo prazo e a orientação espacial. Uma lesão nessa estrutura leva a prejuízo da memória e desorientação. É uma das primeiras estruturas acometidas na demência de Alzheimer; a redução de seu volume é um dos marcadores mais precoces para o declínio cognitivo.
- Giro do cíngulo. Está relacionado ao processamento da dor e das emoções, à memória e à autorregulação. Uma lesão no giro do cíngulo ocasiona emoções inapropriadas, falta de medo, prejuízo na sensação de dor e déficit de aprendizado. Sua disfunção já foi observada no autismo, no transtorno bipolar, na depressão, no transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), no TEPT e na esquizofrenia.
- Hipotálamo. Regula o comportamento e as atividades fisiológicas do organismo. Controla muitas funções autonômicas, como fome, sede, temperatura, pressão arterial, frequência cardíaca e atividade sexual. Integra informação de diversas áreas em resposta a diversos estímulos (p. ex., a luz, que regula o ciclo circadiano). Os sintomas de lesão do hipotálamo estão relacionados a agressividade, estresse, hipotermia, hipersonia, letargia, automutilação, ganho ou perda de peso e aumento ou diminuição do desejo sexual. Sua disfunção já foi relacionada a depressão, transtorno bipolar, esquizofrenia e TEPT. Faz parte do chamado eixo hipotalâmico-hipofisário-suprarrenal (HHS), atualmente muito investigado pela estreita relação existente entre sintomas psiquiátricos e disfunções endócrinas.
Neurotransmissores e vias
Dopamina
As principais vias dopaminérgicas têm origem sobretudo na área tegmental ventral e na substância negra e se projetam para os córtices pré-frontal e frontal basal, o nucleus accumbens, o corpo estriado, o tálamo, o hipotálamo, a amígdala e o hipocampo. Essas vias estão relacionadas a regulação dos movimentos, sistema de recompensa, cognição, sintomas psicóticos e outras funções (Figura 1).
[ Figura 1 ]
Representação esquemática das principais vias dopaminérgicas.
Fonte: @shuttherstock.com/Ben Schonewille/Educational models of two brain hemispheres isolated on black background.
Noradrenalina
Suas vias têm origem principalmente na área tegmental lateral no tronco encefálico e se projetam para os mesmos locais das vias dopaminérgicas, além do cerebelo e da medula espinal. Estão relacionadas com regulação do humor, vigília, cognição e outras funções (Figura 2).
[ Figura 2 ]
Representação esquemática das principais vias noradrenérgicas.
Fonte: @shuttherstock.com/Ben Schonewille/Educational models of two brain hemispheres isolated on black background.
Serotonina
As vias serotonérgicas têm origem nos núcleos da rafe no tronco encefálico e se projetam para os mesmos locais das vias noradrenérgicas. Estão relacionadas com regulação do humor, ansiedade, sono e dor (Figura 3).
[ Figura 3 ]
Representação esquemática das principais vias serotonérgicas.
Fonte: @shuttherstock.com/Ben Schonewille/Educational models of two brain hemispheres isolated on black background.
Acetilcolina
Seus circuitos têm origem no tronco encefálico, no núcleo estriado, no núcleo basal de Meynert, no núcleo septal medial e na banda diagonal de Broca (presente no córtex frontal basal). Projetam-se para os córtices pré-frontal e frontal basal, o hipotálamo, a amígdala e o hipocampo. Estão relacionadas com a cognição e, principalmente, com a memória (Figura 4).
[ Figura 4 ]
Representação esquemática das principais vias da acetilcolina.
Fonte: @shuttherstock.com/Ben Schonewille/Educational models of two brain hemispheres isolated on black background.
Histamina
Seus circuitos têm origem no hipotálamo e se projetam para os núcleos da base, a região frontal, a amígdala, o hipocampo, o tálamo e a medula espinal. Estão relacionados com o despertar, o estado de vigília e o sono (Figura 5).
[ Figura 5 ]
Representação esquemática das principais vias da histamina.
Fonte: @shuttherstock.com/Ben Schonewille/Educational models of two brain hemispheres isolated on black background.
Ácido gama-aminobutírico
O ácido gama-aminobutírico (GABA) é o principal neurotransmissor inibitório do SNC. Está presente na maioria dos circuitos.
Glutamato
É o principal neurotransmissor excitatório; também está presente em todo o SNC.
Principais circuitos envolvidos no comportamento
Circuitos corticocorticais
São os circuitos mais importantes para a regulação do comportamento e da cognição, pois processam as informações e promovem a interação dos demais circuitos neuronais. Por meio desses circuitos, uma região cerebral pode influenciar a atividade não só de outra, mas também, de forma indireta, de uma terceira região. Um exemplo é o circuito do córtex pré-frontal dorsolateral, que se conecta com a amígdala e o hipocampo mediante conexões esparsas, mas tem influência no funcionamento dessas estruturas indiretamente pelo cíngulo anterior e pelo córtex orbitofrontal.
Circuito córtico-tálamo-estriado-cortical
O circuito córtico-tálamo-estriado-cortical (CTEC) permite que a informação seja enviada do córtex para estruturas inferiores. O córtex pré-frontal se projeta para o estriado e depois para o tálamo. Ambos, tálamo e estriado, interagem apenas com áreas específicas do córtex. O estriado, por sua vez, apresenta conexões entre seus componentes e, posteriormente, se conecta ao tálamo. O tálamo retorna o estímulo à área onde se originou no córtex pré-frontal. São exemplos de funções relacionadas:
- Circuito CTEC para funções executivas: córtex pré-frontal dorsolateral – estriado – tálamo – córtex pré-frontal dorsolateral.
- Circuito CTEC para atenção: região dorsal do cíngulo anterior – estriado inferior – tálamo – região dorsal do cíngulo anterior.
- Circuito CTEC para as emoções: região subgenual do cíngulo anterior – nucleus accumbens – tálamo – região subgenual do cíngulo anterior.
- Circuito CTEC para a impulsividade: córtex orbitofrontal – caudado inferior – tálamo – córtex orbitofrontal.
Esses circuitos iniciam-se e terminam em uma célula piramidal. Basicamente, seu funcionamento se deve a aferências inibitórias (mediadas pelo GABA) e eferências excitatórias (mediadas pelo glutamato). As eferências seguem distribuição topográfica, em que as células piramidais das lâminas 1 e 2 se projetam para outras áreas do córtex; as células da lâmina 5, para o estriado e o tronco encefálico; e as células da lâmina 6, para o tálamo. Tanto o GABA como o glutamato exercem a função de regular o início ou o fim da atividade da célula piramidal (fenômeno liga-desliga). Entretanto, há outros neurotransmissores que regulam esses circuitos, como a noradrenalina (NA), a dopamina (DA), a serotonina (5-HT), a acetilcolina (ACh) e a histamina. Esses neurotransmissores têm o papel de intensificar o sinal da eferência e, assim, evitam que a célula seja estimulada por estímulos provenientes de outras áreas. Em outras palavras, esses neurotransmissores auxiliam na seleção do estímulo.
A liberação das monoaminas, por sua vez, é regulada por transportadores pré-sinápticos e enzimas metabolizadoras. Essa regulação é responsável pela eficiência do processamento das informações. Tal dado é de extrema importância, pois o funcionamento desses fatores é secundário aos mecanismos genéticos ambientais.
Estudos que utilizam técnicas de IRM estrutural evidenciam redução volumétrica do hipocampo, da amígdala e do giro para-hipocampal nos pacientes com esquizofrenia em comparação a controles saudáveis, particularmente à esquerda. Outros estudos observaram que essas reduções poderiam estar correlacionadas à gravidade das manifestações psicopatológicas. Pesquisas que usaram a técnica de espectroscopia por ressonância magnética demonstraram menor concentração de N-acetil aspartato (NAA), um marcador indireto de viabilidade neuronal, no córtex frontal e no hipocampo de pacientes com esquizofrenia. Da mesma forma, pesquisas com a técnica de IRM estrutural observaram diminuição do volume de substância cinzenta no córtex pré-frontal, no hipocampo e na amígdala em pacientes com episódio depressivo em comparação a controles saudáveis, correlacionando os achados ao tempo de doença, à gravidade e ao número de episódios.
Referências
Conteúdo originalmente publicado em: QUEVEDO, J. ; IZQUIERDO, I. (Orgs.). Neurobiologia dos transtornos psiquiátricos. Porto Alegre: Artmed, 2020. 388 p.
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Autores
Andrea Parolin Jackowski
André Zugman